quinta-feira, julho 25, 2013
o som das palavras organiza o mundo
como a história começa
ela começa assim:
mudei de niterói para caxambu.
concluía ainda alguns acabamentos na casa e a luz ainda não chegara. mas eu já morava na casa e ela estava com sua respiração em mim. então, às noites, durante uma hora era
aceso o lampião de gás e eu manuscrevia esta história feita de uma visão inaugural das gentes e da terra. à noite as coisas ganham um toque de irrealidade, um movimento aparece, os gestos ganham vultos desproporcionais quando a fraca luz os projeta como sombras nas paredes.
ousaria até afirmar que este é um escrito de sombras, tal a confusão que os grilos, quando cantam lá fora mais o silêncio quando eles se calam, provocam na mente acostumada que era aos carros roncando nas ruas, às sirenes, buzinas, uma porta que bate, o elevador geme na subida, vozes altas, os sussurros, tudo o que ficou no
passado e refletem no silêncio do presente , até na delicadeza da chuva que pede licença para lavar as telhas.
a primeira conhecida que fiz aqui tem a mania de cutucar a pessoa com quem fala e a cada frase vir com o refrão, pois é, não é mesmo? foi do hábito dela que saiu a vontade de consultar os sentimentos alheios e do meu ângulo escrever cada história.
hoje, mais de vinte anos passados já nem sei mais se sou a casa. aprendi quitandas e a amar a respiração das paredes. quando elas espirram digo saúde e quando os cachorros latem lá fora lembro que a vida transcorre na noite quando o céu se avizinha da bisbilhotice com seus insaciáveis olhos.
o tempo passou e ainda escrevo com certa nostalgia de sabores, afetos e este insistente som de palavras a ecoar pela casa.
mesmo agora, quando só, sinto o silêncio na tentativa de formar frases.
na verdade, o som das palavras organiza o mundo.
esther lucio bittencourt
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Um comentário:
...lindo .....
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