sábado, julho 26, 2003

para pensar, sentir e pensar

sobre o que Antonio Bulhões, editor do Abknet News em carta aberta diz ao Presidente Lula


Sábado - 26/07/2003
Abknet News - Editorial

Exmo. Sr. Presidente Lula da Silva:

Há coisas que a gente faz contra a própria vontade. Eu, por exemplo,
preferiria não escrever isso agora. Quer dizer, preferiria não ter motivos
para escrever. Seis meses é muito pouco tempo para julgar seu governo. Muito
pouco para julgar muitas coisas, principalmente um governo. A gente vê aqui,
vê lá, ouve aqui, acolá, vai calando mas, sem querer, começa a ficar
desconfiado.

Será que seis meses também não é pouco para o índice de desemprego bater um
recorde desses? E igualmente não é pouco para autoridades financeiras
internacionais, famigeradas pelo desprezo que dão a causas populares e
problemas dos países pobres, elogiarem um governo ? O seu governo ? E os
elogios que vêm de figuras como Bush (Deus que nos proteja) & Cia. ? Não vou
entrar em detalhes para não aumentar esses pensamentos negativos. Os maus
pressentimentos.

Só mais uma coisa: Essas críticas com jeito de rebelião vindas do seu
próprio partido também vieram muito cedo, não é verdade ? Tão cedo que é de
se f icar matutando, quer dizer, deveras desconfiado.

E essa história de Fome Zero, que valha a intenção, não possui assim um
lance de populismo, de acionismo assistencialista, de ilusionismo? Sem falar
nos rumores nada bonificadores que têm acompanhado a campanha ? Aqui pra
nós, Presidente, a gente sabe que não é esse o caminho. É como aquela
história de Mobral, lembra?

Presidente, não siga o canto da sereia. Esse canto é traiçoeiro.
Não leve a mal essas linhas, nem pense que somos do contra. Viu na sua
eleição como os brasileiros que vivem fora pensam e agem? A gente pode dizer
que deu uma força psicológica e eleitoral. O senhor até nos escreveu uma
carta, lembra?

Por falar em fora do Brasil, não imagine que o FMI e correlatos, nem esses
governos do primeiro mundo vão dar uma sopa na boca da gente. Eles sim,
podemos julgar não apenas pelo que têm aprontado nos últimos seis meses, mas
há dezenas, centenas de anos. Ainda que nos últimos seis meses tenham
perdido um pouco do pudor que adquiriram na marra anos atrás. Estão tirando
a máscara e mostrando a pouca vergonha, o pouco respeito que guardam pelos
povos menos "desenvolvidos" (Desenvolvidos??).

Não caia nessa conversa mole de globalização. Querem mesmo é passar manteiga
no nosso nariz. Veja que, na conta dessa tal globalização, a Europa e os EUA
financiam e incentivam a própria agro-pecuária com nada menos do que um
bilhão de dólares, isso mesmo, em números: US$ 1.000.000.000,00 por dia, Sr.
Presidente. Por dia! Um jornal aqui calculou que uma vaca européia é mais
rica do que um negro africano.

Enquanto uma vaca é subvencionada com 800
(oitocentos) dólares por ano pela União Européia, um africano recebe por
ano 7 (sete) dólares de ajuda. Ajuda não, esmola. Não vamos falar sobre os
trilhões usados para armamentos destinados a aumentar a desgraça dos povos
mais pobres sejam na Ásia, nas Arábias, na África, no mundo todo.
Uma criança africana pode valer menos do que uma vaca?


Falo isso porque, como brasileiro, acho que me toca diretamente e devo muito
ao povo africano. Seja na cultura que assimilei, na comida que tenho
saudade, na música que me fascina. Mas falo isso, principalmente, para
lembrar quem são esses fariseus do primeiro mundo. Não mudaram nada.
Siga outro caminho, Presidente, senão daqui a seis meses a nossa vaca é que
vai pro brejo. Tá certo, a gente vive aqui fora, mas a esperança que a gente
carrega é a mesma de quem vive no Brasil. A gente continua brasileiro do
mesmo jeito. Afinal de contas o senhor não deixou de ser nordestino porque
foi morar em São Paulo e virou presidente. Não é verdade?

Atenciosamente,
Antonio Bulhões
Editor - ABKNet

http://www.abknet.de/carta.htm

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