sexta-feira, agosto 06, 2010



nesta foto: décio, sebastião carvalho e iderval garcia, de bigode









DÉCIO MAFRA, MEU AMIGO



décio mafra morreu dia 24 de julho de 2010
ponto
foi ricardo quem me contou no dia 28, por aí
peguei o telefone da ciléa para ligar e não o fiz.

somente hoje consigo falar sobre a morte dele depois que vi o filme, pela segunda vez, " no vale das sombras" com Tommy Lee Jones, Susan Sarandon e Charlize Theron, in the valey of elah, dirigido por paul haggis a partir da história de marc boal. narra a retirada das tropas aliadas do iraque e do afeganistão, ou melhor, a consequência deste absurdo. ou seja, a mesma de alguém cortar a cerca viva de minha casa sem que eu desse autorização para tanto.
este, acredito, ter sido a última análise de um filme feita pelo décio .

filho de itanhandu, município vizinho, - o avô é nome de rua em caxambu- era dentre tudo o mineiro.
quando joão guimarães rosa lançou tutaméia vi décio, no sofá da casa dele, acompanhado de dicionários, a procura de entender as palavras.
tutaméia era o livro da época e o termo que sempre ouvi minha mãe dizer para designar que alguma coisa não valia à pena, uma tutaméia.

décio, ricardo, iderval e eu, os três mosqueteiros. e não sei quem era dartanhan, por ser o mais jovem; eu ou iderval. fizemos página literária em jornal, nos conhecemos assim, participamos do cpc da une. dédio era da diretoria.

anos mais tarde, casada, morando no rio grande do sul, recebo carta do ricardo: mantenha-se escondida, os milicos a procuram.

pensei: já era. com esta carta me encontram.

no entanto faltava organização de todos os lados e abundava a porra louquice. da parte deles, claro, pois supunham lutar contra um exército de jovens armados por ho-chi-mim, rússia e fidel castro. a arremetida de mourão filho de minas gerais foi paradigmática. pensava em invadir o rio de janeiro e perdeu-se no caminho. quando toda minas sabe que estradas curvas tomar, quais as serras azuis e as que choram para desembocar na do mar.

nesta última crônica, após apreciar no vale das sombras, décio conta sobre a dúvida/angústia dele em deixar itanhandu, amores de caxambu e aparições de óvnis para aprimorar-se em juiz de fora. formou-se em direito. advogou. está aqui o que ele escreveu. companheiro décio mafra:

"•• Corria os anos 50/60 e, de verdade, eu ainda não tinha me decidido se iria ou não pra Juiz de Fora. Aliás, minto: fui, mas aí já é outra estória! Eu andava cismado com aquelas aparições na Serra da Mantiqueira, sempre no lusco-fusco, quando a noite se comprazia em dominar aquelas imediações. Enquanto na cidade, no domínio dos postes de luz, as ruas e imediações não se mostravam fantasmagóricas! Na madrugada, silêncio pleno, cachorros e possíveis lobos à distância orquestravam o ambiente. Eu sabia que, depois da Ponte de Ferro, havia um lugar de plenos poderes dos fantasmas da noite: a mulher de olhos vazados dando “o bote” nos desavisados caminhantes nos trilhos da estrada de ferro, os meninos que brincavam de mocinhos & bandidos na rua Alice, a rua dos mortos, e aquele banco rodeando uma. fogueira brava, de cujo tronco se visualizava um “olho” e dele escorria uma coisa verde e mal cheirosa, situada na rua Dos Figueiredos!

O que enredava a minha vida, como disse acima, era aquela luz azulada que corria de um lado a outro da Serra da Mantiqueira. Depois, quando se firmou a estória dos discos voadores, fiquei na dúvida: era aquilo que se alcunhava de fogo-de-santelmo, ou a luz dos ossos dos mortos do cemitério velho, ou então a cantilena do Argemiro, o primeiro Disque-Joquei que conheci: sossega, leão! O Flash Gordon ainda não pousou no Planeta Mongo! Ele está a caminho!"

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por falar em ho chi mim...

o pai de amigo meu gostava muito de ler as tirinhas do detetive charlie chan criado por Earl Derr Biggers na década de 20, do século passado. era um chinês-americano, valente detetive, mas que em nada parecia com hercule poirot , maigret ou miss marple. chan fazia parte da polícia de honolulu e lutava contra seu arqui inimigo fu-manchu.
devido a admiração do pai meu amigo foi batizado com o nome do detetive, charlie chan, e o sobrenome de família que omito porque, quem sabe, ele ainda pode ser chamado para prestar contas, em outro golpe de estado a ser dado. pois não é que charlie foi afastado da universidade, da assessoria de imprensa do governo do estado por ter sido denunciado como cúmplice de ho-chi-mim?

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bem, de nossa convivência, décio, ricardo, iderval e eu, surgiu a editora engra que lançou nada mais nada menos do que os poemas do neto de augusto dos anjos, da geração dos concretistas de 50, do século passado; ricardo augusto dos anjos.
deveríamos lançar também o livro de silvan paezzo, mas desistimos quando vimos ricardo vender livros como dejeto, aos quilos, ao peso, pois não gostara do título: "após a tragédia".

é ele quem me avisa das mortes dos companheiros. mora em teresópolis e, segundo ele, décio, o mais saudável de nós, foi primeiro. ele tem pontes no peito, iderval garcia luta contra o câncer e eu contra o terceiro avc.

décio não tinha nada e morreu de enfarte fulminante. era o menos cínico de nós todos, afirma ricardo.

como diria minha mãe, a vida é uma tutaméia. e eu não tenho nem uma foto nossa para pendurar na parede desta casa em minas.

esta foto pertence ao acervo de aníbal bragança. foi tomada em 2007 quando aníbal recebeu o título de intelectual do ano. eu sentara entre vania e eda lucia, mas devo ter sido abduzida no momento da foto. ou fui encontrar com minha irmã, lembro agora.



Hora do hino: Labouré Lima, Manuel Martins, Israel Pedrosa e Cacá Fernandes (em primeiro plano); Gentil Moreira de Souza, Ana Laura Diniz, Décio Mafra (de blusa vermelha) Manuel Lourenço Neto, Helena e d. Maria, Vânia Fróes, Cristina e Wagner Rocha. Ao fundo, à esquerda, Kiko e Álvaro Fernandes Filho, Axel Grael, Teodoro Koracakis, Wanderlino T. Leite Netto, Beatriz e Ary Vasconcellos, Eda Lúcia Damásio entre outros.

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