sexta-feira, dezembro 30, 2005



O QUE PODEREMOS NOS DESEJAR, NESTA VIRADA DE ANO?


Então, meu filho diz assim e eu desdigo. Então, meu filho conta a vida, e eu oro. Resolvi, meu filho, ser menos perplexa. Tá difícil, você mesmo diz, parece que as pessoas desejam ser bandidas. E cantam este fardo como se glória fosse em alto e bom som. Você anda pelas ruas das cidades grandes, foge das balas trançadas, como sanguessugas, escrevendo a morte. Você acredita que não é compulsivo e, por isto, pode cortejar as drogas crendo que, a qualquer momento, delas se afastará. Filho estou ausente de sua vida... hoje, até porque você deseja: como segurar a onda de mãe careta.

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Estas sombras, que aí aparecem, assistem, meu filho, à morte da abelha mãe, ou observam apenas as grades dos portões as janelas do palácio, acreditando participar da cerimônia de passagem de um estágio de vida para outro, que é única, intransferível, inenarrável... há um país de luto em frente ao seu suserano.

Eu sou o meu país de luto pela morte da esperança, por saber que a vida de meu filho é tão mais sofrida que a minha, embora eu tivesse feito o máximo para torná-la branda. Eu sou a assistente pasmada, sabendo que participo de uma vida sem resquícios de vida, amarga como sangue de jiló, vermelha como as bombas explodindo as entranhas.

Eu sou a mãe que ousou participar de uma geração que pensava modificar o mundo e vejo nas rugas, já delineadas em meu filho, na sua visagem sofrida, que eu ajudei a construir o pior: um mundo sem perspectiva.

Tentarei ser mais ativa. Mas como? Pelo menos te amando mais, meu filho. De momento é o que farei.. Entenderei esta nova forma de viver onde as cidades se autoatropelam, devoram seus habitantes a se esvaírem pelos bueiros, pazra chegar perto de você e, afagar seu sono, sob alguma marquise.

Tanto terei de aprender... pois meu amor é pouco para a vida que lhe foi sonegada: um ar mais puro com que encher os pulmões, pelo nascer do sol que já vem encoberto na fuligem da poluição, o excessivo calor do efeito estufa que atordoa os nervos, pela camada de ozônio que se evapora, pela flora e fauna que você não pode ver por estar extinta... tudo isto é minha culpa. E nem todo o amor do mundo, por mais imenso, poderá amar contra isto. Ou evitar que pingue de seus olhos este pasmo, esta perplexidade: minha mãe mentiu: prometeu-me um mundo que existia na fantasia dela. E deixou-me a aprender sozinho esta realidade!

Perdão, meu filho, por oferecer tão parca mãe para necessidades tão humanas como apenas concordar que é assim, como você me conta, a vida que sobrou para você e seus amigos, e concordar e concordar sem parar de dizer que devemos buscar um mundo com sentido para a nossa razão ou desrazão. Onde nossos sentimentos encontrem a mão .

Enfim, perdoe-me eu a mim. Por ter acreditado em vão no logro onde nossa geração se desencontrou. Este momento de passagem é a hora do perdão. Precisa ser o tempo do perdão! Perdôo-me. Perdôo-me?


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